terça-feira, 24 de agosto de 2010

As muitas cores do Carnaval de Fortaleza

Quem pensa que o “mela-mela” é alguma novidade no Ceará saiba que este é um parente retardatário do antigo entrudo, abolido por ordem do nosso Intendente Guilherme Rocha, em 1905. O velho entrudo era o banho d’água aplicado traiçoeiramente a algum desavisado. Assim, a brincadeira de mau gosto, apesar de proibida, permaneceu nos arrabaldes da cidade e nos vilarejos mais distantes, migrando para o interior do Estado onde perdura até hoje.


Durante muito tempo, o Carnaval se resumia a alguns foliões vestidos dos pés à cabeça com uma batina e capuz que lhes cobria todo o rosto, deixando apenas os olhos de fora. Tais camisolões eram chamados de “dominós”. Aos animados grupos ou indivíduos que saíssem fantasiados com o dominó, dava-se o apelido de papangus.

Por volta de 1866 surgiram os bailes de máscaras que, por ordem do chefe de Polícia começavam às 19h e se estendiam até as 2h, sendo proibidas as danças ‘indecentes’. Os blocos de Carnaval, na verdade, surgiram dentro dos clubes elegantes, como o Clube Iracema e o Cearense, que na disputa da simpatia do povo resolvem botar, literalmente, seus blocos na rua. Já as batalhas de confete eram realizadas no Passeio Público, onde até o governador do Estado comparecia com seu secretariado.

Também não podemos deixar de lembrar o corso, uma carreata com veículos decorados com motivos carnavalescos, que percorria as principais ruas da cidade com famílias inteiras fantasiadas e a jogar lança-perfume nos populares.

Algumas pessoas marcaram época com suas fantasias criativas ou de mulher, dizendo piadas e fazendo graça, o que depois se passou a chamar de “sujos”. Os anônimos, mascarados ou não, individuais ou em blocos, fazem a alegria do Carnaval de rua até hoje e dão um colorido todo especial com suas críticas e protestos bem-humorados.

Hoje, o Carnaval de Fortaleza tem outras cores. Não mais o “Cordão das Coca-colas” ou o bloco das “Baianas”. Tampouco os corsos, os papangus e as pessoas fantasiadas nas ruas. A presença mais marcante do nosso Carnaval é a dos maracatus cearense que, na maioria, se organizam para esse ciclo. O primeiro maracatu cearense é descrito por Gustavo Barroso: um bloco com características funestas, tanto pelas vestimentas e caras pintadas de preto quanto pelo ritmo lúgubre e dolente, num desfile de 1898. Mas prefiro a versão corrente entre os carnavalescos, que afirmam ter sido o “Ás de Ouro” o primeiro, criado por Raimundo Alves Feitosa, em 1936.

Os maracatus têm um dia oficial para desfilar na Av. Domingos Olímpio, num evento promovido pela Secretaria de Cultura de Fortaleza, em parceria com a Federação das Agremiações Carnavalescas. As outras manifestações, com exceção dos sujos, que também desfilam, são inspiradas em brincadeiras de outros estados. Mas o Carnaval de Fortaleza tem crescido em força e beleza, ganhando ruas, praias, praças e lugares simbólicos, seja pela mão dos brincantes, que resistem, seja da iniciativa municipal, que ano a ano investe mais na realização da festa, apoiando a manutenção de grupos e estimulando o surgimento de outros, como o dos afoxés. Atualmente, três desfilam na folia momina: Afoxé Acabaca, Filhos de Oyá e Oxum Odolá.

Wagner Pereira da Silva - Coord. do Fórum Cearense de Cultura Tradicional Popular e coordenador de Cultura Tradicional Popular da Secretaria de Cultura de Fortaleza

(Artigo do Jornal O Povo dia 24/08/2010 – Opinião )

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